Cristina Judar

26 DE MARÇO 
      
      Imagine que esse texto está escrito sobre uma página vermelha. 
     Diva ficou em dúvida em relação à cor do colar de bolotas que usaria naquela noite: verde ou azul.
     O fim da loja é ocupado por uma moça oriental de sobrancelhas franzidas, a rainha mal-humorada de um território recém-dominado, em relação ao qual ela ainda não tem certeza se valeu a pena tanto esforço para conquistar. Na dúvida, resolveu abrir uma loja de bijou popular na rua Sete de Abril, centro de São Paulo.
    Diva saiu do escritório de homologação e se deu conta de que estava com sede. Olhou para a direita e viu um esboço do Theatro Municipal. Olhou para a esquerda e viu uma fileira de ônibus. Ao lado, um carrinho vendia salgadinhos da marca Delícia e refrigerantes da marca Guaxupé. Resolveu seguir em frente.
      Na parede estavam pendurados lenços de todas as cores, na seguinte promoção: um por cinco, dois por oito. Diva experimentou os anéis da banquinha de um real. Tinha um moço espiando às suas costas com um espanador na mão. Diva achou ele gatinho. 
      A dona da loja provavelmente passou meses acondicionada em um navio sem ventilação até chegar em São Paulo. No auge do pior verão dos últimos 100 anos. Isso se ela veio mesmo para o Brasil nessa época, e não quando criança.
      A loja de sucos ficava bem na esquina e ostentava um cartaz com letras brancas e vermelhas: suco exóticos, venha provar! Pitanga, Pitaya, Umbu, Carambola, Cajá. Qualquer um por seis reais. Batido com leite fica dois reais mais caro. 
      Beijinho no ombro pras inimigas. Tocou alto. E o moço que senta no banquinho de salva-vidas só pra espiar se as freguesas não roubam começou a cantar junto. O do espanador se pôs a espanar, Diva sentiu uma onda de energia ao ouvir a melodia. Pensou na festa da noite que se aproximava e passou a procurar o colar com mais vontade.
      O suco de frutas vermelhas estava muito bom e compensou o preço caro. Veio em dois potes, Diva se esforçou para conseguir engolir tudo. 
      As bolotas começavam menores na parte que fica perto do fecho de tarraxa, e ficavam maiores conforme se aproximavam do meio do colar.
      Huang, a dona da loja, assistia ao Datena em uma mini televisão colorida. Encontraram na Praça da Sé a cabeça de um corpo esquartejado ontem, em Higienópolis.
     Diva desistiu do colar e comprou uma bolsinha de mão de renda preta e fecho tic-tac. Quinze reais, na promoção. Mesmo preço do ingresso para a festa, com direito a um copo de vinho ou cerveja - ambos de marca não revelada.