Dália Éstes

EU PENDURADA NO PONTEIRO

Eu pendurada no ponteiro do relógio como uma criança pendurada pelo sapato na engrenagem da roda gigante, uma medonha música de parque temático, se espalhando como um vírus xexelento de inverno, eu aprendi a perceber que o horror está pintado de rosa, e tem cheiro de algodão doce, artificialidade, tiros no alvo que valem a vida do meu ursinho de pelúcia, tiros no alvo, no peito, no meu, principalmente. Eu quase caí do tempo. Eu quase fui solta pelo cadarço do sapato. Não há nenhum lugar infantil no mundo que não guarde um choro, e também não há nenhum outro lugar do mundo que não tenha perpetuado esse choro ao infinito através do olhar triste do adulto. Corro para as margens, mas sempre expando, e meu centro aumenta: agora mesmo sou do tamanho de um planeta, e mesmo assim, pequena o bastante para me sentir quebrada, partida, ou prestes a ser pisada por alguém distraído: não gosto dos brinquedos, eles fazem coisas como: bater, girar, correr, eles fazem coisas, e nós estamos tão suscetíveis, e eu não vim aqui para brincar, eu sei que vim fazer outra coisa, eu me sinto enjoada em quase todos os brinquedos desse parque maldito.