Vlademir Lazo

VIGÍLIA

Escrever poema
é como um quebra-cabeça
montado
sem pressa
em que o começo
não é pelo início
nem pelo fim
mas pelo seu núcleo
secreto.

Uma peça
que encaixa
na outra
como a caixa
de brinquedo
de lados com
cores diferentes
que é preciso juntar.

Escrever poema
é como a montagem
de um filme
que não passa no cinema
mas se desenrola
no intervalo
destinado
à legiões que pregam
no deserto.

Escrever poema
sobretudo o de amor
é como conceber o romance
macabro
em que com sangue se tinge a escrita
a musa é a morta-viva
e o autor um zumbi
ou coisa qualquer que o valha.

Como o sujeito que estende o cigarro
à boca do desconhecido que definha
querendo a última tragada no campo de batalha

Escrever poema
é só uma aventura
que se completa
na calada escura
da noite
em que sonâmbulos
também são poetas.

Escrever poema
é preciso estar indiferente
e concentrado
esquivo e constante,
manter-se longe e ao mesmo tempo
vigilante.

Foto de Paolo Raeli.