João Rocha

O CASAL HOLOGRAMÁTICO

O enigmático casal chegou e o rapaz pediu logo um lanche. Sentaram-se à mesa retangular envelhecida de longas histórias anteriores. Ele, não perdeu tempo. Tirou o vaga-lume virtual do bolso e se pôs a acessar as chamadas redes infindáveis. Ela, para não ficar na contramão da modernidade, também tirou da bolsa – de capa palidamente rosada de tantas idas e vindas pelo chão das travessas – seu aparelho intransferível.

Conversaram por algumas horas. Entre mensagens de textos e outras invenções da hodiernidade. Falaram sobre como estavam apaixonados e que até como gostariam de envelhecer em cúmplice ato de afeto urbano. Riram repetindo letras como um trem demente rasgando os touchscreens. Olharam-se – por alguns instantes – apenas para tirar fotos – em entorpecidas demonstrações de cumplicidade – para arremessá-las – em poucos segundos – em seus perfis esmerados – antes de pedirem a conta.

Tempos depois, tiveram que digitar suas senhas novamente para acessar às lembranças daquela noite. Não lembravam mais dos rostos, no entanto, estava tudo armazenado nas nuvens.

Foto de Nicolas Bruno.