J. P. Marcowicz

JOHN LENNON FUMOU MEU ÚLTIMO CIGARRO

Ando pelas calçadas sujas
do centro da cidade
com uma garrafa de vinho na mão e
dois Carlton solto dentro do meu blusão preto.
Velhas fotos em Polaroid se
decompõem nos bolsos da minha calça
assim como as boas lembranças
de um tempo passado.

‘’Eu me sinto um merda’’, eu dizia.

Brinco com a fumaça
formada pelo frio
que sai da minha boca.
Na minha cabeça
John Lennon dizia que estava cansado
‘’I’m so tired’’,
as minhas pálpebras estão
quase se fechando
com o peso do mundo que
cai em cima delas.
Uma lágrima gelada escorre pelos
meus olhos.

‘’Eles é que são os merdas’’, meu amigo respondia.

Um mendigo me chama e
me pede um cigarro.
Ele fuma enquanto eu
termino de matar o meu vinho
sentado em seu cobertor cheio de pulgas.
Conversamos sobre
naves espaciais,
aranhas gigantes que o perseguem na madrugada e
sobre sua mulher que é rainha em algum pais da África.
Meu Deus,
nem os mendigos me entendem.
Jogo algum dinheiro para ele
e saio vazado.
Entro num bar sujo
e peço umas dose,
os bêbados riem da minha cara
feia de burguês.
A pontapés eles falam que lá
não era lugar para mim.

‘‘Eu não sinto mais nada por você’’, ela me disse na última vez que a vi.

Vejo um homem sentando no meio-fio
tocando um violão surrado,
ele usava uma camiseta do Corinthians e
vendia pulseirinha do reggae.
Vocês podem não acreditar mas
era o velho Lennon
que largou a fama
para viver de esmolas e
usar crack com os viciados na rua.
Dou para ele meu último cigarro
e em coro cantamos
‘’I’m so tired’’
como se em nossos corações
existisse uma cicatriz
que nunca ira desaparecer.

A vida se parece
com trincheiras de um campo de batalha e
o amor
é a mulher com o sorriso mais bonito da cidade
te acenando pela janela dum ônibus fedendo sovaco.

Foto autor desconhecido.