Eduardo Paiva

NA LIRA DOS ANOS

De perto via meu riso vermelho refletido em teus óculos
O peito repousava teus gostos, teus pêlos
Meu desejo procurava a rota do teu ser
Razão, loucura, ninguém sabe da pior,
A vontade me tomava
nas palavras bem articuladas.
enquanto você me explicava,
Godar e o Pasolini
Eu flutuava em cada dose daquele conhaque
Imaginava os meus pés sobrepondo os seus
Por tantos anos quis ser tuas nuvens
Pensava que assim acharia teu porto
Assim me atirei em teu nó.

[quatro luas ]

Tua testa aumentava a cada ano
sua barba ficando grisalha com os pelos rebeldes
Nossa senhora repousando em teu peito
Tua fitinha do Bonfim desbotada
Aquele all star vermelho rasgado que eu comprei em fevereiro
A tua camisa que eu peguei emprestada
O peito cheio de amores,
Engole a camada do tempo
Bebendo no teu desapego
Os pares anunciando-te o recomeço
Tua geografia delineando o corpo dos anos
Por agora as linhas repousam em tua face
Que lhe entrega a beleza do que sinto.

[as pernas crescem ]

O tempo lhe ofereceu um barco à vela
A gente fica longe
Olhando o canto quando não mais se olha
Voltamos no branco da noite
Apenas os pássaros no breu
A cadência do calar
Crer para ver
Aquilo que nos espera
Por enquanto o manto verde me alivia o sono
Enquanto mordo minha saliva e sumo na fumaça do teu cigarro
Esperando a brisa das palavras soprar no teu cabelo.
Caminhando na incerteza dos teus passos vazios
Eu não vim até aqui para não morrer de amor.

[ a arte e o olhar]

Dentro da janela do encanto
As vozes calaram-se
O amor e os olhos
Quando eu olhei para as páginas encontrei a paz
Não entendi e nem quis mais nada
Naquele domingo que eu acordei com o cheiro do teu café
Na manhã do teu descanso
no canto da tua maré
na porta do teu deserto
a cozinha, o violão e o silêncio.
a caneta e os novos tempos.
Buscava-te sempre cru pela vida a fora
nas palavras que povoam o teu envelhecer .

Foto autor desconhecido.