Edson Valente

FUNDO

Esse abismo que se me faz entender
Ribanceira erodindo aos poucos
Nas sobras de um manto me agarro
– se é que fui majestade,
Talvez nem de mim mesmo –
Referir-se ao acaso é não mais que justificativa
Para o fracasso
Ou invocar os astros
Que se refletem na superfície mutável do fosso
Onde quedam os olhos no fardo da
Aproximação
– Uma vez dentro, largado, nu, no caminho, em movimento,
Por irrefutável atração mórbida,
Há de durar o tempo da respiração guardada,
Há de durar o espaço enquanto não se esmagam os
Ossos,
Há de se prolongar o fim,
Eis que sua medida é o quanto se afasta do que em vaga lembrança
Teria sido um começo –
E no pó das sombras, nas ondas do desapego,
Um esmagamento súbito
Inseto rendido na teia do apreço
Incinerado pelas luzes do que teria sido, tudo,
Se houvesse ao menos um raso, ou qualquer nada, de
Profundo.

Foto de Nicolas Bruno.