Frank Vilar

POUCOS ENTENDEM MINHAS PIADAS.

Poucos entendem minhas piadas. Tenho as mãos trêmulas e uma retina caindo. Tudo o que me possui são livros. Não há mimos em minha aparência. Amo demais os cadáveres e gente pouco conhecida. Observo curioso as portas dos hospitais e cemitérios. As bibliotecas são minha única guarida. Minhas paixões são proibidas. Há um doente tossindo passarinhos fedorentos no meu coração. Tenho muitas lembranças guardadas e poucas recordações na mente. Há um sem-número de arrependimentos nos calcanhares das minhas ideias. Meus sonhos de infância são ninjas e astronautas. Não me tornei nenhum dos dois. Cansei de ter sonhos ainda por cima. Espiritualidade para mim é perda de tempo. Não sou nem tão bêbado quanto pretendo nem tão disposto quanto preciso. Desconheço o preço das coisas. Odeio ônibus, motocicletas, caminhões, automóveis. Minha criatividade é só um brinco discreto na orelha de um miserável na penumbra. Nunca tive sorte suficiente. Detesto ver imbecis sorrindo. Meu rosto no espelho fere minhas vistas. Vegeto ambulando por ruas familiares. Sempre vazias. Nunca desejei conhecer pessoas demais. Ando cansado de formular imagens. A matemática, que já me salvou a vida, hoje me odeia. Engasguei minhas diversões e preguiças num sábado eterno. Ando enganando meus pais, amores, parentes. Meus irmãos mais novos não me respeitam. Há problemas insolúveis ficando amigos meus. Nunca trabalhei demais. Prepotência está no meu RG. A asma espreita meus travesseiros. Minha boca se fecha durante minha insônia. O relógio corre da minha presença. Ando cansado de não fazer nada. Você aí, doutor, responda agora: isso é doença? Ou só outro canalha qualquer se achando o umbigo do próprio mundo, sufocando como criança mimada ante pequenos desejos insatisfeitos?